O texto do dito cujo ao
qual me referi é exatamente este:
Em cada animal não
vejo senão uma máquina engenhosa, à qual a natureza ofereceu sentidos para
recompor-se por si mesma, e para defender-se, até certo ponto, de tudo o que
tende a destruí-la ou estragá-la. Percebo exatamente as mesmas coisas na
máquina humana, com a diferença de que a natureza faz tudo nas ações do animal,
enquanto o homem concorre para as suas, na qualidade de agente livre. Um
escolhe ou rejeita por instinto, e o outro, por um ato de liberdade: o que faz
com que o animal não se afaste da regra que lhe é prescrita, mesmo quando lhe
fosse vantajoso fazê-lo, e que o homem se afaste frequentemente dela, em seu
prejuízo. Assim é que um pombo morreria de fome perto de uma vasilha repleta
das melhores carnes, e um gato, diante de uma porção de frutos ou de grãos,
embora tanto um quanto o outro pudesse perfeitamente se nutrir com o alimento
que desdenha, se ousasse experimentá-lo. É assim que os homens dissolutos se
entregam a excessos que lhe provocam febre e morte porque o espírito deprava os
sentidos, e a vontade fala ainda quando a natureza se cala... Mas, mesmo que as
dificuldades que cercam todas essas questões permitissem a discussão sobre essa
diferença entre o homem e o animal, há outra qualidade muito distinta que os
distingue, e sobre a qual não pode haver contestação: é a faculdade de se
aperfeiçoar, faculdade que, com a ajuda de circunstâncias, desenvolve
sucessivamente todas as outras e reside em nós, tanto na espécie quanto no
indivíduo. Enquanto um animal é, ao fim de alguns meses, o que será durante
toda a sua vida, e sua espécie, ao fim de mil anos, o que era no primeiro
desses mil anos. Por que o homem está sujeito a se tornar imbecil? Não é
absolutamente por que retorna assim a seu estado primitivo, e o animal, que
nada adquiriu e nada tem a perder, permanece sempre com seu instinto, e o
homem, perdendo com a velhice e outros acidentes tudo o que sua
perfectibilidade lhe havia feito adquirir, torna a cair mais baixo do que o
próprio animal?
(Discurso sobre a
Origem da Desigualdade entre os Homens - Jean-Jacques Rousseau - 1755)
Agora deixo vocês com
estes dois (geniais) músicos em uma performance de total e pleno improviso,
onde mostram claramente a opção tomada, de livre-arbítrio, de não serem somente
mais dois imbecis dizendo que fazem música. Simplesmente fazem bom uso de sua
liberdade para criar aquilo que a emoção do momento pede.
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