7 de jun. de 2015

CANALHA



Nada como um belo e ensolarado domingo...para não ir à praia (rs). Se ir à praia é a sua “praia”...vá! Básico.
Estou tirando o meu domingo para, mais uma vez, me contradizer por completo. Adoro me contradizer (rs). Se for por algo que amo, farei isso quantas vezes quiser. Básico 2!

Vou me contradizer em tudo que disse no tópico PARANDO. Mas...”veja bem”, não será assim tão completo minha contradição. Só parcial. Disse que quero aprender a ser enxuto e quero mesmo. Tentarei.

A contradição está no fato de que este tópico será o mais longo e com um dos vídeos mais demorados também de todo o meu blog. Só isso, gente!

Quem se assustar com o tamanho do texto e do vídeo...vá curtir a sua praia; ou a sua “praia”, qualquer que seja ela. Vou fazer deste modo, porque é o meu desejo. Básico 3!  (e chega de basicalidade também; cansei!)

Ele ficará longo pois resolvi juntar um time de futebol de salão, todos meio bruxos (o Zeca foge um pouquinho, mas chegará lá), em uma torre de Babel que construí.

Juntei Clóvis de Barros Filho, Jards Macalé, Walter Franco, Nelson Rodrigues e Zeca Baleiro. Que puta salada!

Quem xeretar bem o meu blog verá homenagens minhas a quase todos eles. É só xeretar. Se quiser. Se voltar muito queimadinho da praia, quem sabe!

Misturei canalhas e “canalhas”; Declaração Universal dos Direitos dos Homens, retirada do show “O Banquete dos Mendigos”, e cinco bruxos, cada qual na sua área; na praia de cada um deles. Canalha com significados diversos. Dor, mau-caratismo ou o que você quiser....

Por isso, sigo na minha também. Estou por aqui, curtindo fazer este post; e muito bem acompanhado, por quem vocês já sabem. Se ainda não sabem...vocês são uns CANALHAS que não seguem meu blog.

Chega. Tentando seguir enxuto.

Passo a bola para os 5 bruxos!!


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Quando soube que a noiva tinha viajado de lotação com o Dudu, sentada no mesmo banco, pôs as mãos na cabeça:
— Com o Dudu?
E ela:
— Com o Dudu, sim.
As duas mãos enfiadas nos bolsos, andando de um lado pa­ra outro, ele estaca, finalmente, diante da pequena:
— Olha, Cleonice, vou te pedir um favor de mãe pra fi­lho. Pode ser?
— Claro.
Puxa um cigarro:
— É o seguinte: de hoje em diante, ouviu?, de hoje em diante, tu vais negar o cumprimento ao Dudu.
Admirou-se:
— Por que, meu anjo?
Ele explicou:
— Porque o Dudu é um cínico, um crápula, um canalha abjeto. Um sujeito que não respeita nem poste e que é capaz até de dar em cima de uma cunhada. O simples cumprimento de Dudu basta para contaminar uma mulher. Percebeste?
— Percebi.
Ainda excitado, ele enxuga com o lenço o suor da testa:
— Pois é.
Passou. Mas a verdade é que Cleonice ficou impressionadíssima. Dava-se com o Dudu, sem intimidade, mas cordialmen­te. Dançara com ele umas duas ou três vezes. Mas como o Du­du fosse fisicamente simpático e educadíssimo, Cleonice guar­dara dos seus contatos acidentais uma boa impressão. Caiu das nuvens ao saber que ele era capaz de “dar em cima de uma cunhada”. Teria, porém, esquecido. Voltando à carga, sentado com a noiva num banco de jardim público, ele começa:
— Meu anjo, tu sabes que eu não tenho ciúmes. Não sabes?
— Sei.
Pigarreia:
— Só tenho ciúmes de uma pessoa: o Dudu. E nunca te es­queças: é um canalha, talvez o único canalha vivo do Brasil. To­do mundo tem defeitos e qualidades. Mas o Dudu só tem defeitos.
Inexperiente da vida e dos homens, ela fazia espanto:
— Mas isso é verdade? Batata?
Exagerou:
— Batatíssima! Quero ser mico de circo se estou mentin­do! — E repetia, num furor terrível e inofensivo: — Indigno de entrar numa casa de família!
OBSESSÃO
Então, sem querer, sem sentir, Lima foi fazendo do Dudu o grande e absorvente personagem de suas conversas. Argumen­tava:
— Você é muito boba, muito inocente, nunca teve outro namorado senão eu. Queres um exemplo? Sou teu noivo, vou casar contigo. Muito bem. O que é que houve entre nós dois? Uns beijinhos, só. É ou não é?
Impressionada, admitiu:
— Lógico!
Lima continua:
— Figuremos a seguinte hipótese: que, em vez de mim, fos­se teu namorado o Dudu. Tu pensas que ele ia te respeitar co­mo eu te respeito? Duvido! Duvido! Dudu não tem sentimento de família, de nada! É uma besta-fera, uma hiena, um chacal!
Crispando-se, Cleonice suspira: “Parece impossível que existam homens assim”. Lima prossegue: “Vou te dizer uma coi­sa mais: o Dudu olha para uma mulher como se a despisse men­talmente!”.
A FESTA
Dias depois, Cleonice está conversando com umas coleguinhas quando alguém fala do Dudu. Então, ela olha para os lados e baixa a voz: “Ouvi dizer que o Dudu deu em cima de uma cunhada!”. Uma das presentes, que conhecia o rapaz, a família do rapaz, protesta: “Mas o Dudu nem tem cunhada!”. Mais tar­de a espantadíssima Cleonice interpela o Lima. Ele não se dá por achado:
— Eu não disse que o Dudu deu em cima de uma cunha­da. Eu disse que “daria” caso tivesse. Você entendeu mal.
Mais alguns dias e os dois vão a uma festa, em casa de famí­lia. Entram e têm, imediatamente, o choque: Dudu estava lá! Jun­to de uma janela, com o seu bonito perfil, fumando de piteira, pálido e fatal, atraía todas as atenções. Lima aperta o braço da noiva. Diz, entredentes: “Vamos embora”. Ela, espantada, per­gunta: “Por quê?”. O noivo a arrasta:
— O Dudu está aí. E não convém, ouviu? Não convém! Imagina se ele tem o atrevimento de te tirar para dançar. Deus me livre!
O MEDO
Na volta da festa, Cleonice faz, pela primeira vez, um co­mentário irritado:
— Fala menos nesse Dudu! Sabe que eu só penso nele? Te digo mais: tenho medo!
Lima estaca: “Medo de que e por que, ora essa?”. Ela pare­ce confusa:
— Essas coisas impressionam uma mulher. — E repete o apelo: — Não fala mais nesse cara! É um favor que te peço!
Ele obstinou-se: “Falo, sim, como não? Você precisa olhar o Dudu como um verme!”. Cleonice suspirou:
— Você sabe o que faz!
ÓDIO
Corria o tempo. Todos os dias, o Lima aparecia com uma novidade: “Vi aquela besta com outra!”. E se havia uma coisa que doesse nele, como uma ofensa pessoal, era a escandalosa sorte do “canalha” com as outras mulheres. Nos seus desaba­fos com a noiva, Lima exagerava: “Cheio de pequenas! Tem na­moradas em todos os bairros!”. Um dia, explodiu:
— Vocês, mulheres, parece que gostam dos canalhas! Por exemplo: o meu caso. Sem falsa modéstia, sou um sujeito decente, respeitador e outros bichos. Pois bem. Não arranjava pe­quena nenhuma. Até hoje não compreendo como você gostou de mim, fez fé comigo e me preferiu ao Dudu. — Pausa e baixa a voz, na confissão envergonhada: — Porque o Dudu me tirou todas as outras namoradas, uma por uma.
Era essa, com efeito, a origem do seu ódio por Dudu, do despeito que o envenenava.
AS BODAS
Chega o dia do casamento. Poucos minutos antes da ceri­mônia civil, Lima, transfigurado, ainda diz ao ouvido da noiva: “O Dudu roubou todas as minhas pequenas, menos você!”. Pois bem. Casam-se no civil e, mais tarde, no religioso. Quase à meia-noite, estão os dois sozinhos, face a face, no apartamento que seria a nova residência. Ele, nervosíssimo, baixa a voz e pede: “Um beijo!”. Ela, porém, foge com o rosto: “Não!”. Lima não entende. Cleonice continua:
— Falas te tanto e tão mal do Dudu que eu me apaixonei por ele. Eu não trairei o homem que eu amo nem com o meu marido.
Lima compreendeu que a perdera. Sem uma palavra deixa o quarto nupcial. De pijama e chinelos veio para a porta da rua. Senta-se no meio-fio e põe-se a chorar.

(Nelson Rodrigues)

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Banquete dos Mendigos (show de 1974 – completo – 1h22m)


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